É uma verdade universalmente reconhecida que mudar a identidade visual de um produto conhecido é difícil. Agora, fazer um total redesign da marca, manter os clientes antigos, e ao mesmo tempo conquistar os novos – o que incitou a mudança, pra começo de conversa – é praticamente impossível. Basicamente, no mundo da marca, mudar a percepção já existente é quase impossível. E agradar gregos, troianos, e todos os outros povos da época, é mais difícil ainda.
Crônica de uma morte marca anunciada
Quando a Microsoft ouviu os clamores de designers ao redor do mundo e matou o Internet Explorer {pra entender, o IE é o purgatório do designer/desenvolvedor, de tão chato que é programar pra ele}, o alívio – ao menos entre o meu povo – foi geral. Daí eles lançaram o Edge, o novo navegador da Microsoft. Promete mundos e fundos. Não sei se cumpre porque ainda não testei. E, pra ser sincera, nem pretendo, porque pra mim navegador + Microsoft = desastre.
Essa é a minha percepção da marca. Essa imagem, essa percepção, não será alterada tão facilmente. Pra mim, e pro meu povo, navegador da Microsoft vai sempre ser um grande tabu. Mas entende, foram quase 20 anos sofrendo na mão desse sádico do IE, primeiro como usuária, depois como desenvolvedora. São incontáveis horas de quebrar a cabeça, primeiro com HTML, depois CSS, pra conseguir fazer algo funcionar bem especificamente no IE. E aí está o problema: era necessário escrever código específico pra um navegador, que não aceitava os parâmetros internacionais colocados para uso de HTML e CSS. Fora os problemas de segurança, a lentidão de carregamento, as incontáveis barras que roubam espaço na tela… Só digo que, no dia que fiquei sabendo da morte anunciada, estorei a espumante…
Mas, voltando à conversa – afinal, nosso assunto aqui é marca -, a Microsoft lançou o Edge, seu novo navegador, e, com ele, veio uma nova identidade visual. Aí começa o drama.

À esquerda, a logo do Internet Explorer; à direita, a logo do novo Edge. ᔥ Creative Market Blog
O canto dos descontentes
Primeiro, o público alvo. A Microsoft é conhecida por querer agradar a gregos e troianos. São os bons moços do mercado de software, onde a Apple e a Adobe são os bad boys que querem governar o mundo não tentam agradar a todos. Os bons moços são os caras que se preocupam com todas as necessidades possíveis de um usuário, e tentam sanar todas elas no mesmo produto – que geralmente acaba sendo um frankenstein que vive dando pau. Os bad boys são os caras que limitam ao máximo as variáveis, pra garantir que o sistema seja redondinho e dê o mínimo de problemas possível. Esta última ão é uma alternativa tão perfeita assim, mas… funciona.
Exemplo de bom mocismo: o Microsoft Word, que além de ser editor de texto, pode fazer gráficos, publicar páginas web, produzir livros, e até apresentações multimidia. Ótimo! Todos os meus problemas se acabaram-se! Não. Os problemas só começaram, porque pra poder oferecer todos esses recursos, o programa fica pesado, dá erros aleatórios, e é super caro. Já os bad boys da Adobe limitam. Têm um programa pra fazer gráficos, um pra páginas web, um pra livros, e por aí vai. Por que isso funciona? Porque os programas são mais leves, são pensados para um uso específico – o que diminui a probabilidade de erro -, funcionam em conjunto, mas infelizmente ainda são caros.
Outro exemplo: o próprio Internet Explorer, que já nasceu meio errado, passaram anos tentando consertar, e nunca conseguiram. Pra ser justa, os navegadores anteriores também não eram grande coisa. Na verdade, eram horríveis. E tinham que ser instalados, e mais um monte de coisa, que vai além da capacidade – ou interesse – do usuário padrão. E então, um dia, chegou o tal do IE, que já vinha instalado no Windows, e tava ali, bonitinho, aquele “e” te esperando pra explorar o mundo fantástico da internet. Perfeito, não? Não de novo. O tal do navegador milagreiro sempre foi uma dor de cabeça praquele pessoal que tinha que preparar o conteúdo pra ser apresentado nele.
Então começamos – nós, os descontentes – a fazer sua caveira, a desenvolver alternativas melhores {leia-se Firefox, Opera, Chrome}, e, em alguns casos, a simplesmente ignorar sua existencia – o que resultou em vários sites não aparecendo, ou aparecendo muito mal, no tal do IE. Até que a Microsoft ouviu. Anunciaram a morte do IE e, alguns dias depois, anunciaram o nascimento do Edge, seu mais novo navegador, super ultra hiper mega power, completamente desenhado do zero.
Atendendo a pedidos
É, também, uma verdade universalmente reconhecida que o usuário – com raras exceções – não gosta de mudanças em seu software. Melhorias, sim. Mudanças, nunca. Os únicos que reclamavam do IE eram os desenvolvedores. Os usuários não estavam nem aí pra longa e custosa guerra: associavam o “e” à internet, e pronto. Não davam bulhufas pros problemas, desde que pudessem acessar seu conteúdo.
Se, para a Microsoft, fosse apenas uma questão de melhorar o produto, bastava redesenhar o velho IE e lançar uma versão atualizada, alertando desenvolvedores das mudanças, sem risco de alienar seu usuário. Mas, a Microsoft escolheu matar um produto, e colocar outro em seu lugar. Escolheu romper um relacionamento de 20 anos com seu usuário fiel, sabendo que esse usuário não aceita mudanças de bom grado. Por quê?
Como falei lá no começo, mudar a percepção pública de algo, especialmente de um produto informático como um software, é muito difícil – e a Microsoft tentou. A meu ver, a escolha pela criação de um novo produto está diretamente ligada à percepção negativa do velho IE pelos designers/ desenvolvedores que faziam sua caveira. É mais fácil, e mais produtivo, ao invés de tentar alterar sua percepção pública – e merecida – pela pequena parcela de descontentes, lançar um produto novo, que não carregue o mesmo estigma do anterior.
Então, como agradar ao desenvolvedor {que de maneira alguma quer ver o IE, e que provavelmente é arredio em relação a navegadores Microsoft, como eu} e ao usuário {que não admite mudanças em seus programas, que não quer perder tempo aprendendo coisas novas que não lhe agregam nada na vida}, ao mesmo tempo? Esta é a grande questão quando se trata de lançar um produto novo: como converter usuários do produto antigo em usuários do produto novo, e, ao mesmo tempo, atrair e converter em usuários aqueles que não aceitavam o produto antigo.
A solução pro nosso povo eu vou dar
Não vou entrar nos méritos da logo em si. Não é esse meu propósito. O foco aqui é a recepção da logo que foi apresentada, como um exemplo do que esperar no caso de um redesign de marca. Nada mais.
A solução para a Microsoft, de acordo com Joshua Johnson do Creative Market, foi repaginar a logo do produto antigo, para o produto novo. Usar a logo do antigo IE, com algumas alterações, para o novo Edge. As modificações foram o suficiente para mostrar que se trata de algo novo, sem causar estranhamento nos que não viam problema algum com o velho.

A logo do novo Edge, sobreposta à logo do antigo Internet Explorer, deixa clara as semelhanças entre as duas. ᔥ Creative Market Blog
Opinião é que nem #@$%&, cada um tem uma
Na minha humilde opinião, concordo com Johnson. A logo é uma ótima alternativa para agradar gregos e troianos, comunicando o novo sem alienar aquele que não gosta de mudança. Agora, se funciona?
Comigo, não. Pra mudar do meu navegador atual, só por algo muito melhor. Também, não confio na Microsoft para fazer navegadores, exatamente pelo motivo que faz a nova logo ser ato de gênio. É impossível agradar gregos e troianos no design. A meu ver, a Microsoft deixa claro, com sua escolha de logo, que está seguindo no caminho já traçado, de agradar a todos – o que já provou não funcionar.
Mais ainda, minha percepção da Microsoft é de uma marca que procura atender todas as necessidades em um mesmo produto, o bom e velho tudo-ao-mesmo-tempo-agora. De programas que prometem mundos e fundos, e que por isso mesmo acabam pecando. Que são instáveis, que me deixam na mão quando mais preciso, mas que sigo usando porque não tenho muita escolha.
E o propósito de toda essa conversa é
Deixar abundantemente claro que com marca a gente não brinca. Que, depois de formada, a opinião é quase que totalmente imutável. É o que o guasca chama “botar batom em beiço de porca”: por mais que tente enfeitar, a pobre porca segue sendo porca, e o que na essência não funciona, por mais que tente ajeitar, segue sem funcionar.
É como nas relações humanas. Sabe aquela criatura que não bate? Aquela pessoa que, por mais que tu tente, simplesmente não te desce, tu não simpatiza, não consegue te relacionar? Poisé. Sempre tem…
Então, meninos e meninas, MUITO CUIDADO com suas escolhas para suas marcas. Se for percebida de uma maneira, dificilmente conseguirás alterar essa percepção. E daí, pra conseguir mudar a situação, geralmente só começando do zero, com marca nova, ou público alvo novo, ou cidade nova, alguma coisa. E não é isso que queremos, correto?
E aí, quero ouvir de ti: já teve uma experiência dessas? Algum exemplo legal? Seja na vida, nos negócios, como a pessoa que fez ou como a pessoa que recebeu a mudança, compartilha conosco a tua história.